Geografia

O lugar da Geografia

Em qual lugar você está?

Em que lugar você nasceu?

Qual o nome do lugar em que você mora?

Aqui há sempre lugar para você!

Ponha-se no seu lugar.

Aqui não é lugar de gracinhas!

Vejamos um slide agora logo abaixo e depois continue lendo.

Há lugar para mim no seu futuro? Lugar de palhaço é no circo! Todos lutam por um lugar ao Sol.

Lugar é uma palavra que geralmente se refere à simples localização de algo, mas pode sugerir regras, afinidades e comportamentos. As questões e afirmações sugeridas acima permitem verificar algumas dessas possibilidades.

Aquelas frases refletem alguns dos diferentes significados que podem ser atribuídos à palavra lugar.

Em alguns casos, basta a simples menção a um nome (de rua, de escola, de bairro ou de cidade) para esclarecer o sentido da afirmação ou responder à questão.

Já em outros, no caso das frases que levam a pensar em nossas vontades, comportamentos e projetos, é preciso mais do que apenas uma palavra para desvendar o significado.

Por exemplo, para responder a questões como “onde (em qual lugar) você está agora?” ou “em que lugar (onde) você nasceu?”, respostas como “na escola”, “em casa”, “em São Paulo”, “no Rio de Janeiro” (ou a simples menção ao nome de qualquer cidade) atendem, explicam e respondem ao que se pede. Mas no caso de afirmações como “ponha-se no seu lugar” ou “todos lutam por um lugar ao Sol”, é preciso recorrer a explicações um pouco mais complexas.

Examinemos mais detalhadamente esses dois últimos exemplos: “ponha-se no seu lugar” e “todos lutam por um lugar ao sol”.

Em qual situação você se lembra de ter ouvido a sugestão “ponha-se no seu lugar”? Provavelmente, quando você ou alguém próximo a você estava fazendo algo ou tendo algum comportamento inadequado para determinado momento ou lugar: por exemplo, fazendo algazarra na sala de aula, falando fora de hora, intrometendo-se em conversa alheia etc. Ou seja, a palavra lugar, nesse caso, é sinônimo de comportamento e leva a pensar nas regras e normas de convivência entre as pessoas; não se refere a algum local específico. Portanto, quando alguém nos diz “ponha-se no seu lugar”, basta mudar de comportamento; em geral, pode-se permanecer exatamente no mesmo local onde nos encontrávamos.

Da mesma maneira, quando alguém diz que “todos lutam por um lugar ao sol”, não está se referindo a nenhuma localidade específica, mas a nossas vidas, nossos projetos, esperanças etc., que, por sua vez, também dependem das regras e normas estabelecidas para o conjunto das pessoas, bem como das histórias e dos espaços que as pessoas vão construindo, em conjunto ou individualmente.

Assim, falar de lugares às vezes não significa falar de localidades, mas de regras, de comportamentos, de histórias, de relações, de projetos e de muitas outras coisas.

Mas como fazer isso sem confundir tantos assuntos e possibilidades?

A geografia é o caminho e o instrumento que permitem estudar e compreender os lugares levando em consideração todos esses possíveis aspectos, sentidos e significados. Portanto, quando nos dispomos a estudar a geografia de um determinado lugar, estamos nos propondo estudá-lo de maneira bastante ampla. Ou seja, da mesma maneira que a palavra lugar pode adquirir múltiplos significados, investigar a geografia desse lugar pode envolver estudos mais diversificados do que a mera localização e descrição de um local.

Por exemplo, vamos investigar alguns aspectos da geografia de lugares específicos e representativos de ambientes muito familiares, como casas, escolas, ruas, praças, quadras esportivas etc.

Não há dificuldade em identificar cada uma das cinco fotos. É fácil distinguir uma sala de aula  de uma quadra de esportes , uma praça cheia de árvores e espaços de lazer de uma sala de estar no interior de uma casa  ou ainda de uma rua cheia de veículos e construções. Basta olhar com atenção para perceber as óbvias diferenças que identificam os lugares e os distinguem uns dos outros.

Entre as imagens do painel 1, as diferenças são tão grandes que bastaria observar rapidamente a aparência dos lugares para identificá-los e distingui-los. Essa rapidez, que permite identificar e distinguir lugares apenas pela aparência, deve-se à familiaridade que temos com os tipos de lugares retratados nas fotos. Ou, dito de outra forma, deve-se ao conhecimento, que já possuímos, das geografias desses lugares.

Esse conhecimento às vezes é tão consolidado que basta um pequeno detalhe para revelar a identidade de um lugar. Assim, a simples visão de um carro, de uma lousa, de um aparelho de TV, de uma bola ou de uma árvore nos remete para os contextos em que normalmente esses itens costumam ser vistos. A partir daí, com mais um ou dois elementos, como carros e asfalto, lousa e carteiras, TV e sofá, bola e torcida, árvores e bancos, já nos sentimos seguros para confirmar que estamos diante de uma rua, de uma quadra de esportes, de uma praça ou de partes de uma casa e de uma escola.

Esses pequenos detalhes, superficiais à primeira vista, na verdade indicam as diferentes funções, regras e matérias-primas que estão presentes em cada lugar.

No caso dos lugares retratados nas fotos do painel 1, sabemos de antemão, por exemplo, que carros, asfalto e calçada (foto B) são elementos que compõem um conjunto muito específico de lugares voltados para atender à necessidade de circulação das pessoas e das coisas de que elas necessitam ou das atividades que elas desempenham. Da mesma forma, carteiras, lousa, professores e estudantes (foto A) são elementos que, combinados, servem para atender a um outro conjunto de necessidades. Pode-se dizer o mesmo da praça, com sua função de proporcionar descanso e lazer, da quadra, com sua função esportiva, e dos locais de moradia.

Ou seja, os lugares são diferentes uns dos outros por causa de um conjunto complexo de questões e de fatores interligados, que envolvem a própria aparência desses lugares, as funções que neles se desempenham, os materiais de que são feitos e as regras que neles se cumprem.

Aliás, aquilo que chamamos de aparência, ou de paisagem, é, na verdade, a maneira como se mostra para nós, observadores, a combinação de funções, regras, materiais e elementos componentes desses locais

Estudar a geografia de um lugar significa, portanto, estudar essa combinação de fatores que as paisagens revelam. Para isso, antes de mais nada, é importante desenvolver, com muitos exercícios de análise e de observação, a nossa capacidade de percepção do significado das aparências desses lugares.

A aparência, ou a paisagem, será sempre o nosso primeiro ponto de contato com o lugar a ser investigado.

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As aparências podem enganar

Há alguns velhos ditados populares que, em geografia e nas investigações ou estudos dignos desse nome, deveríamos tomar, no mínimo, como avisos de atenção e de cuidado: “as aparências enganam” ou “nunca se deixe levar pelas aparências…”.

O aspecto visível de uma paisagem, isto é, sua aparência, pode revelar muito sobre a geografia desse lugar. Mas, para confirmar o que determinada aparência revela, é preciso lançar mão de outros importantes recursos, principalmente quando não se trata apenas de investigar paisagens simples, facilmente identificáveis e bastante familiares.

Esses recursos consistem basicamente de técnicas de indagação e investigação. Elas permitirão ir além das aparências e perceber as identidades, as diferenças, as funções, as regras, os significados, as histórias e tudo o mais que possa contribuir para que alcancemos o conhecimento e a compreensão da geografia de um determinado lugar.

Vejamos alguns exemplos de procedimentos que propiciarão esses passos, além das paisagens ou das aparências dos lugares. Muitos desses procedimentos serão objeto de estudo ao longo dos próximos capítulos.

As fotos do painel 2 ao lado ilustram bem os riscos que correremos se não levarmos a sério o aviso referido anteriormente: “não se deixe levar (apenas) pelas aparências”.

Observe a foto A. Tudo o que se pode distinguir é a predominância de diversos tons de verde em algum trecho de mata ou bosque, com árvores e arbustos de diversos tipos e tamanhos. Não haveria motivo para estranhar se alguém, diante dessa foto, dissesse que o lugar retratado corresponde a algum trecho de uma grande floresta, brasileira ou estrangeira.

Mas, ao contrário, se alguém apresentasse a mesma foto dizendo tratar-se de parte de uma grande cidade, como Rio de Janeiro (Brasil) ou Berlim (Alemanha), a reação seria de espanto, pois, quando se fala de cidades, nossa imaginação nos remete a aspectos típicos das cidades: carros, ruas, avenidas, multidão e gente apressada.

A verdade é que imagens semelhantes à foto A poderiam ser extraídas tanto de algum lugar da paisagem retratada na foto B – cidade do Rio de Janeiro, por exemplo -como daquela retratada na foto C – Floresta Amazônica.

Na grande região amazônica pode-se obter inúmeras fotos com imagens semelhantes à da foto A. Mas poderíamos fazer algo semelhante também no Rio de Janeiro: bastaria fotografar um trecho de algum dos muitos parques da cidade.

Portanto, ao investigar paisagens como as da foto A, antes de mais nada é importante conhecer seu contexto, isto é, o conjunto de lugares a que pertence a parte que pretendemos identificar. Caso contrário corre-se o risco de confundir situações muito distintas e, assim, comprometer toda a pesquisa geográfica. A propósito, a foto A mostra uma trilha no interior da floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro.

Dependendo das dificuldades, necessidades e exigências para identificar determinada paisagem, pode-se recorrer a outros recursos de investigação, além do reconhecimento do contexto. Por exemplo, à análise da composição do ar, à caracterização e identificação dos tipos de plantas t

e de animais presentes, à classificação e medição dos tipos e dos níveis de ruídos, à observação do comportamento das pessoas etc. Todos esses elementos serão muito diferentes se forem colhidos, medidos e observados numa floresta ou num trecho de mata em um parque dentro de uma cidade.

“Não se deixe levar pelas aparências.” É preciso ir além, perceber as identidades, as diferenças, as funções, as regras, os significados, as histórias…

As aparências e os conteúdos dos lugares

Como se vê, observar aparências, reconhecer contextos, analisar e identificar elementos constituintes são etapas importantes e necessárias da investigação geográfica de um lugar qualquer.

Na maior parte dos casos, é preciso lançar mão de todas essas etapas. Às vezes, a simples identificação do contexto basta para caracterizar determinado lugar. Outras vezes é preciso ir além. Mas são raros os casos em que a simples observação das aparências conduz à correta identificação do lugar e ao conhecimento de sua geografia.

Agora observe as imagens do painel 3.

O que elas acrescentam ao nosso estudo?

Os elementos que constituem cada uma das paisagens são diferentes, como os fatos que nelas se desenvolvem ou as regras e funções que nelas aparentemente se estabeleceram.

No entanto, essas fotos mostram exatamente o mesmo lugar.

Como não há truque, só há uma explicação: entre uma foto e outra deve haver uma diferença de tempo, de história, que justifique as mudanças que ocorreram na paisagem do lugar retratado.

De fato, essas fotos foram tiradas com diferença de dez anos (1992 e 2002) no mesmo local, a Praça do Patriarca, na cidade de São Paulo. O que era um antigo terminal de ônibus (foto A) transformou-se num amplo espaço para pedestres (foto B).

Ou seja, àquelas etapas de investigação já citadas – observar aparências, definir contextos, identificar elementos -, a situação do painel 3 acrescenta mais uma: conhecer a história dos lugares.

Agora observe as fotos do painel 4 e responda: em qual foto é possível observar a presença de seres humanos e suas obras e em qual isso não é possível?

Se dependesse apenas do que aparentemente vemos nas fotos, as respostas seriam óbvias: na figura A não há gente nem vestígio de gente; na foto B não há natureza nem vestígio de coisa natural. Mas, em função das discussões anteriores, é provável que você esteja em dúvida:

  •    E se o contexto da foto A revelar que se trata de um trecho de um parque produzido e plantado num espaço urbano?
  •    E se a floresta da foto A tiver sido derrubada para dar lugar à paisagem retratada na foto B?
  •    E se as casas e prédios que vemos na foto B tiverem sido construídos em parte com material extraído da floresta da foto A?
  • E se o lugar da foto A for um parque natural, uma área de preservação ou um território indígena?

As respostas a essas e outras perguntas são importantes para responder à indagação original – em qual foto é possível observar a presença de seres humanos e suas obras e em qual isso não é possível?

Se você, diante da questão, fez alguma dessas perguntas, isso indica que o conteúdo deste capítulo foi compreendido. Só por isso, por não cair mais nas armadilhas das aparências de alguns lugares, você merece a condição de aprendiz de pesquisador da geografia dos lugares.

Nos próximos capítulos, o que aqui se disse será objeto de aprofundamento e ampliação.

Nossa aventura pela geografia apenas começou.

Geografia, um saber hologeico

Nas aulas de História, de Português e outras línguas, de Matemática, de ciências (Física, Química e Biologia) ou de Geografia, temos contato com os diferentes aspectos que explicam e compõem o mundo em que vivemos. Cada uma dessas matérias pretende nos ajudar a entender alguns desses aspectos. Por isso, algumas se atêm mais ao tempo, outras ao espaço, outras à composição das coisas, aos seus movimentos, às suas quantidades ou, então, à comunicação entre as pessoas e assim por diante. O objetivo é facilitar o entendimento do mundo, ajudar a compreender sua realidade. E, à medida que isso acontece, as diferentes matérias também se aproximam umas das outras.

A Geografia, para nos situar no mundo, explicar os lugares e suas paisagens, obriga-nos a estabelecer comunicação direta com um conjunto de outras matérias: da História às Ciências, da Matemática às línguas. Essa característica da ciência geográfica, bem como sua forma de abordar os diversos temas e de organizar os vários conteúdos de que trata, deve-se, em boa parte, a duas grandes personalidades da história recente da ciência: o francês Paul Vidal de La Blache (1845-1918), que definiu a Geografia como “ciência dos lugares”, e o alemão Friedrich Ratzel (1844-1904), que afirmava ser o verdadeiro geógrafo aquele que conseguia “abraçar o mundo inteiro” com as próprias mãos. Essa vontade, “de abraçar toda a Terra”, que move a Geografia e os que a praticam, Ratzel batizou de princípio hologeico, juntando as palavras gregas hólos (total, totalidade, completo) e gê, géia (Terra, mundo).

DlALOGANDO COM OUTROS SABERES E CONHECIMENTOS_

Segundo o texto, sem comunicação e relação constante entre as diversas disciplinas e áreas do conhecimento (Geografia, História, Línguas, Matemática e outras ciências), entender o mundo que nos cerca fica muito mais difícil. Então, encontre pelo menos três pessoas (pode incluir seus próprios pais, parentes ou professores) ligadas a essas distintas áreas do conhecimento por razões profissionais ou gosto pessoal, e pergunte-lhes se estão de acordo com essa afirmação. Peça para darem pelo menos um exemplo ou contarem algum caso que confirme a importância dessa ideia (de que “a comunicação entre as matérias é algo muito importante”).

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