História

Comércio de Escravos no século XV

As redes de comércio africanas no século XV

Ao contrário do que habitualmente se crê, no século XV a África não era um continente habitado por povos isolados do restante do mundo. Desde a Antiguidade, todos os povos do norte faziam parte de uma extensa rede comercial que integrava todas as regiões ao redor do mar Mediterrâneo e punha em contato a África, a Ásia e a Europa.

Com a expansão do Islã no século VII, comerciantes berberes, usando o camelo como animal de transporte, atravessavam o Saara e atingiam regiões mais ao sul do deserto. Nelas, adquiriam uma variedade enorme de mercadorias, vindas de todos os cantos do continente por meio de uma intrincada teia de contatos comerciais. Marfim, peles, tecidos, ouro, resinas e escravos, entre outras riquezas, atravessavam milhares de quilômetros, passando de mão em mão, até chegar aos movimentados mercados do Sael.

Islamismo pela ÁfricaFoi também a difusão do islamismo pela África que favoreceu o crescimento dos contatos comerciais entre os africanos da costa oriental e os povos do Oriente Médio, que, no século XVI, fundaram colônias nas ilhas próximas à costa.

Esses povos juntaram-se a outros colonizadores vindos da Pérsia e da índia. Seus descendentes, apesar de africanizados, não perderam contato com os povos de seus antepassados e assumiram o papel de intermediários nos negócios entre a África Oriental e os comerciantes originários das terras banhadas pelo oceano Índico.

A chegada dos europeus à costa ocidental da África fez com que o comércio de escravos deixasse de ser apenas um negócio entre muitos outros, para se tornar uma das atividades econômicas mais importantes e lucrativas do continente.

Até o século XVI, o interesse dos comerciantes europeus não esteve voltado prioritariamente para o negócio de seres humanos. Ouro, marfim e outros produtos atraíam o interesse dos mercadores. As mercadorias eram então adquiridas em feitorias instaladas em diversos pontos do litoral africano.

Assim, no período que se estende de 1450 a 1600, acredita-se que o número de escravos capturados para alimentar o comércio transatlântico foi pouco superior a 400 mil indivíduos, provenientes em sua grande maioria da região da Alta Guiné. Essas pessoas escravizadas eram distribuídas pelo próprio continente africano, pelas ilhas atlânticas, pela Europa, onde eram utilizadas, sobretudo, no serviço doméstico. Foram também para as colônias espanholas na América, especialmente para trabalhar nas minas de prata do Peru.

Porém, a partir do século XVII, o tráfico de escravos pelo Atlântico cresceu de maneira vertiginosa: 1.348.000 cativos entre 1601 e 1700, e 6.090.000 no século seguinte, de acordo com estimativas. No total, acredita-se que mais de 11 milhões de pessoas foram arrancadas de seu lugar de origem para alimentar o tráfico num período de cerca de 400 anos. Os pontos de venda ampliaram-se, e o comércio humano em larga escala passou a ser feito também de Luanda, de Costa da Mina e da Zambézia. Um número expressivo desse total foi trazido para os portos do litoral da América Portuguesa, principalmente o de Salvador e o do Rio de Janeiro.

Durante todo o tempo em que o tráfico de escravos teve lugar na costa atlântica da Africa, os comerciantes contaram com a colaboração de chefes e reis africanos. Esse envolvimento com os povos locais ora foi mais ativo, ora menos, mas em nenhum momento pôde-se prescindir dele.

Os reinos africanos diante do comércio de escravos

Na era das Grandes Navegações, os portugueses foram os primeiros a estabelecer contato com os povos africanos da costa ocidental da África. No início, os tratos (como era chamado o comércio) aconteciam a bordo das naus, onde era realizado o escambo de artigos trazidos de além–mar por produtos da terra.

Com o passar do tempo, construíram barracões e feitorias fortificadas em ilhas próximas à costa ou no litoral, sempre mediante a anuência dos reis ou chefes locais.

A partir do fim do século XVI, franceses e ingleses passaram a disputar o comércio atlântico com Portugal, buscando também estabelecer pontos de ocupação no litoral da África. Nessa concorrência, na qual os seres humanos eram a mercadoria mais lucrativa, acabaram por participar das rivalidades políticas (internas), alterando o equilíbrio de forças nos reinos locais.

A fixação dos estrangeiros no litoral da África dependia de uma série de negociações com os mandatários locais, que incluía a troca de presentes, a aceitação das regras existentes e o pagamento de taxas e tributos. Aos europeus era quase sempre vetado o cultivo do solo, e proibido ou dificultado o avanço para o interior do continente. Por essa razão, o abastecimento daqueles que viviam nas feitorias dependia da colaboração dos africanos. Caso ficassem insatisfeitos, podiam simplesmente interromper a oferta de pessoas escravizadas para os estrangeiros ou até cortar-lhes a água e o alimento. E se decidissem expulsar os europeus das fortificações, eram capazes de reunir exércitos numerosos e equipados, contra os quais mesmo as poderosas armas de fogo tinham pouca chance. Por essa razão, os europeus buscaram quase sempre ‘estabelecer contatos amistosos e alianças políticas e militares com os reis e chefes africanos.

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No entanto, os efeitos da escravização em massa e da mercantilização do tráfico acabaram por enfraquecer os Estados africanos, que, já na passagem do século XVII para o XVIII, apresentavam dificuldades para impor suas regras aos estrangeiros. Estes foram se assenhoreando da situação, até assumirem o controle dos negócios, ao lado dos comerciantes africanos, enriquecidos e alçados à condição de poderosos senhores. No princípio do século XIX, início do imperialismo, poucos seriam os governantes africanos que ainda conseguiam impedir o avanço dos europeus sobre suas terras.

A resistência ao avanço português

Entre os portos de trato utilizados pelos portugueses na África subsaariana, um dos mais importantes foi o instalado na ilha de Luanda, no século XVI. Desse porto, Paulo Dias de Novais iniciou, em 1571, um empreendimento de conquista das terras continentais, pertencentes ao reino Dongo (ou Ndongo), na tentativa de controlar o comércio de escravos na região e por acreditar que encontraria ricas minas de prata. Assim, em 1576, Paulo de Novais fundou a vila de São Paulo de Assunção de Loanda, ainda em área de influência do manicongo.

Contudo, ao imporem condições ao chefe local, os portugueses enfrentaram a primeira grande resistência armada na África. Nos anos seguintes, as tensões se ampliariam. Ao estenderem a penetração esbarraram na firme resistência do chefe local. Daí teria início uma longa guerra que se estenderia até 1622.

Para vencer seus oponentes, os portugueses buscaram o apoio de guerreiros e caçadores imban-galas, vindos do sul e do interior, e conhecidos pelos portugueses como jagas. No entanto, a paz conquistada foi instável e breve.

Poucos anos depois, os holandeses, que disputavam com os portugueses o controle sobre o comércio de escravos do porto de Luanda, aliaram-se à rainha Jinga, reacendendo os conflitos na região. Foi somente em meados do século XVIII que a situação se resolveu, com um novo acordo entre os portugueses e os governantes do Dongo. Apesar disso, somente no século XIX os portugueses conseguiram finalmente avançar para o interior de Angola.

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